sábado, 31 de maio de 2008

UMA SANGRIA

Não tinha havido invasão de gente bárbara,não tinha havido guerra,mas eles aí vinham em magote,homens,mulheres,crianças,pejando caminhos,amontoando-se em salas de espera e nas plataformas das estações dos comboios. O que os movia? Era a fome,simplesmente. Não tinham nada,a não ser a força dos seus braços e iam vendê-las.
Nas suas terras, não havia quem deles precisasse,mas lá mais para baixo,onde se estendiam searas a perder de vista, e vinhas e olivais de muitos milhares de pés,contavam com eles e já estavam à sua espera. Eram menos exigentes,sendo ,assim, os preferidos. É a luta pela vida. Ficavam ainda muito agradecidos.
Lá se arranjavam como podiam. O que era preciso é que no fim,quando do regresso,sobrasse alguma coisa de jeito,de modo a ampará-los no resto do ano. A palavra de ordem seria,pois, poupar,mesmo em coisas essenciais.
Andaram nisto anos e anos. Era a ignorância,o alheamento. Não lhes ocorria outra saída. Mas um dia,alguém deu aviso. Olhem que há para aí uma maneira de a gente se arranjar melhor. Dizem que em França e noutros países há para lá muito trabalho e ganha-se mais. Vamos lá experimentar. Foram,gostaram e foi uma sangria.
As condições,no começo,não foram lá grande coisa,mas a isso estavam eles bem acostumados. Mas melhoraram com o tempo. Assim,valia a pena,diziam os coitados,com alguma mágoa. Sim,porque aquilo não era a sua santa terrinha. Havia que ter paciência,que era o que não lhes faltava. Voltariam um dia,de vez,quando amealhassem coisa que se visse.

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