quinta-feira, 15 de maio de 2008

O CÉU E O INFERNO

Era aquela uma verdade muito sua e,talvez,de mais alguém. Tinha-a aprendido ele na escola da vida. Não precisara,nem tivera,pode dizer-se,outra. E ali estava ele a anunciá-la,pleno de convicção. Um homem que se fizera à sua custa,sabe Deus como. Um homem,naquela altura,muito rico. Um homem que partira do nada. Andara de porta em porta,a esmolar trabalho. Tinha prazer em o revelar.
Pois fiquem sabendo que o céu e o inferno são cá em baixo. Tê-los ia experimentado,a valer. A morte é o fim definitivo. Do pó viemos,ao pó regressamos.
Era religioso,muito religioso,que era assim que a sua mãezinha lhe tinha ensinado,
a sua mãezinha,que ao pó regressara. Podia ter aproveitado,como muitos fazem,para aludir a Deus. A sua mãezinha,que Deus lá teria no Céu,com certeza. Mas não,era muito,muito religioso. Nunca se esquecia das suas orações,como a sua mãezinha lhe ensinara.
Viera,naquela altura,lá de um dos seus palácios,lá onde tinha coudelaria e tudo o resto a condizer. Viera ver se outros seus bens continuavam lá onde os deixara. Mas não usara,desta vez,o seu jipão. O comboio o trouxera. Era muito mais económico. Sim,que a vida não estava para bricadeiras. Estava-se a fazer precisado.
Ele sabia que havia muita fominha,muita miséria. Também passara por isso,não era novidade para ele. Mas a culpa era toda dessa gente. Trabalhassem,como ele fizera,ali no duro. Eram todos uns calões. Dêem-lhes sementes,dêem-lhes enxadas,que aquilo é terra abençoada,é capaz de dar três colheitas num ano. Ponham-nos a trabalhar. São uns mandriões,não querem mexer uma palha.
Era religioso,muito religioso. Não tenham ilusões,que o céu está cá em baixo. Para o ter,façam como eu. Não é a mandriar. Labutem,como eu labutei. Conheci bem o inferno,que está também cá em baixo. Era religioso,muito religioso. Não se esquecia,nunca,das suas orações.

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