domingo, 21 de setembro de 2008

ENCANTO OU DESENCANTO

Lá perdera a camioneta da carreira. E agora? Tinha de pôr pernas ao caminho,que elas estavam ali muito capazes de chegar onde queria ir. De resto,a tarde convidava,pois o calor não era muito e ao longo do caminho havia muita coisa para rever. Até devia agradecer o ter chegado tarde.
E então foi um desfilar de marcos que tinham sido o seu encanto,ou desencanto,anos atrás. Em primeiro lugar,uma vala que sangrava a lezíria. As aflições que ela dera quando das cheias. Era um rio a competir com um maior. Mas também nunca mais se esquecera de um verão. Fora lá que apanhara um dos maiores sustos da sua vida. Um matulão,abusando da sua força,fizera-o engulir água escusada. Fora ali,que ainda lá estavam as canas onde se refugiara,ou,pelo menos,o sítio delas.
Seguia-se,não muito longe,a casa da "guarda",onde estavam assinaladas as alturas das cheias de maior respeito. Dum lado e doutro,eram só vinhedos a perder de vista. As cepas pareciam árvores e a ramagem cobria o chão,aquele rico chão,dos nateiros que as inundações deixavam,uma riqueza que se desprendria das muitas encostas a montante.
Antes da Tapada,desenhava-se um túnel de amoreiras a que tantas vezes trepara,em larga companhia,à cata de folhas,mas também de mel,em que se desentranhavam os frutos. Já lhe chegava ali o cheiro do Tejo. Para o atravessar,esperava-o a comprida ponte,uma fonte de sobressaltos. É que não se estava livre de alguma inesperada passagem de toiros. Mas lá se encontravam,de onde em onde,uns resguardos para tranquilizar. No termo dela,podia dessedentar-se. A água era salobra,mas em dias de canícula não se enjeitava.
Faltava só uma encosta íngreme,por onde se chegava mais depressa ao destino. E fazia como tinham feito tantos,como os conquistadores do passado. Servia-se dum carreiro,talvez desses perdidos tempos,uma vereda estreita que teria muito para contar.

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