segunda-feira, 1 de junho de 2009

MOÍDO DA VIDA

Não era a Luísa que tinha de subir a calçada,de António Gedeão. Era um operário que tinha de ir trabalhar lá para o fim do mundo,e,depois,regressar a casa,vindo do cabo do mundo. Regressar a casa é como quem diz,porque não passava ela de um acanhado quarto,onde dormia também o bébé. O que é que lhe havia de apetecer,após um dia de grandes canseiras? Repousar,certamente,mas,sobretudo,dormir,num sono interminável. Era bom de apetecer,era,só que o seu bébé não lho permitia. A fome,as dores,ou sabe-se lá mais o quê,faziam com que ele estivesse a interromper,vezes sem conta, o sono do pai. E uma noite,talvez uma noite em que lhe apetecesse dormir tempos sem fim,uma noite em que mais moído da vida se sentisse,perdeu a cabeça. Levantou-se,pegou num ferro e calou o filho para sempre. Sabia lá ele o que fazia. Terminaram ali aquelas canseiras. Iria ter muito tempo para recuperar, lá na cela que lhe destinaram.

De um filme muito antigo,de André Cayatte

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