sexta-feira, 29 de maio de 2009
PARA NÃO MAIS ESQUECER
O desafio. A doença. Os receios. O médico. Não pense nisso. Avance. O avião.O invisível cacimbo. O grande rio. A piroga. O sentar no fundo. O encharcamento. O jipe. O vermelho da terra,da poeira. O verde do amplo vale. Os dois rios mansos,de água verde-escura. As galerias de palmeiras. Os tufos densos das bananeiras. O capim seco,amarelado. A lixa de silica,solta,ao mínimo abanar. O capim verde,gigante ou anão. As espinhosas. Os espinhos.A infecção. 40 graus. O enfermeiro-médico, competente. Uma semana de braço ao peito. Os crocodilos. Dois,apenas,à vista. Uma cabeça,na água. Um,filhote,a aquecer-se,ao sol,na margem. As cobras. Uma,para amostra,ainda assim,moribunda,por atropelamento. O rasto de outra. Mosquitos,nuvens. O repelente milagroso,perfumado e salvador. As pacaças fugitivas.Os passarinhos sentinelas,vigilantes,parasitas,denunciadores de perigos. As fugas. Uma delas,a da infecção. Se o homem tem medo do bicho,o bicho tem mais medo do homem. Casuais,os cruzamentos. As picadas,avenidas, umas,veredas estreitas,outras. Rastos de elefantes. Uma desgraça,a sua passagem. Selectivos,em primeiro lugar,os rebentos tenros. Um desastre. Os javalis em fuga,espavoridos,do fogo. As lagoas. Os tapetes de nenúfares. As cortinas de papiros. Os cactos-candelabros. A dieta.Bananas,ovos,galinha,torradas,bolachas,papaia. Uma revelação,a papaia. Sempre. A papaína,digestor da carne mais dura. As galinhas de mato, as rolas,as perdizes,aos bandos. Em paz. Outros valores. Uma caçada,à noite,com holofote,para ver como era. Pares de olhos,fixos,como que hipnotizados. O tiro. O estertor,no escuro. O silêncio. Nunca mais. Os cágados pachorentos,nos caminhos,no fundo das covas,no fresquinho,de companhia, pacífica,com sardaniscas,formigas de todos os tamanhos,ratinhos. Charcos com sanguessugas. Charcos com bilharse. Botas de borracha,de cano alto,para travar investidas,nem sempre evitadas,por desníveis inesperados. Picadas de centenas de metros,entre barreiras de capim de todos os tamanhos. O que andaria lá por dentro?Covas espaçadas, de um metro de fundo, para nelas se enfiar e bisbilhotar. O sinal da cruz,discreto,como arma. O ajudante,o Armando,um jovem destemido,inteligente,alegre,leal,companheiro,sempre disponível,sem regateios. As chuvadas repentinas,barulhentas. As folhas das bananeiras,como chapéus eficazes. O acordar da floresta. Uma sinfonia de cores. Os tons de verde,do amarelo,do vermelho. O anoitecer,abrupto,os tons violáceos.O embondeiro,o senhor grave,de impor respeito. O catequista,talvez de quinze anos. Deambulava. Crianças rodeavam-no,disciplinadas. As avarias. Idas para casa,ao longo dos rios. Os cheiros. As queimadas,mestramente conduzidas. Os macacos,nas palmeiras. Macacos sem vergonha,certos da impunidade. A água filtrada. A água do banho,bombada directamente do rio. Sabonetes "life-buoy". O mata-bicho,lá no palmar,no mato,onde quer que se estivesse. Aparecia,como por milagre. Sobras,nem uma. O Armando encarregava-se de as dividir, irmamente,com quem aparecesse. Peixes,muitos,de bocarras abertas,para não se perder o que viesse na corrente.O regresso. Ainda combalido da infecção. Uma aventura por estrada convertida em lago. Ao leme,um desnrascado. Pelos morros,não podendo,por pontes improvisadas. Sapadores eram três e capim não faltava. Quatro meses de arrasar e de novidades,a cada segundo. Para não mais esquecer.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário