terça-feira, 11 de maio de 2010

AR DE MAU

Passa os dias encostado às paredes,conversando com os amigos,ou aos balcões das tabernas junto ao mercado. A idade também já não dá para muito mais. Pois há uns dias mudou de vida. Foi arvorado em guarda de um prédio em construção. Assumiu compenetradamente o seu papel. Ali gastava as horas,de manhã à noite,vigiando. A sua voz até parece que engrossou. Ficou com ar de patrão. O construtor fazia mesmo uma fraca figura ao seu lado. O homem é alto,a cara mete respeito,o boné descai-lhe para os olhos,em jeito de rufia de bairro. Nenhum carro,por pouco tempo que fosse,podia estacionar perto da obra. Logo ele aparecia,com ar de mau,a mandar avançar. Para melhor observação,colocava-se no passeio,no outro lado da rua,acompanhando as diferentes fases ,com olhos de que aquilo era seu. Julga-se até que lá dormiu. Continuou,por ocasião da venda,a permanecer nas imediações,e mesmo depois de tudo transacionado. Fora ali que pontificara meses a fio. Não o esqueceria nunca e sentir-se-ia muito agradecido pela confiança nele depositada. Ronda-o,agora,amorosamente. Dá a impressão de ser um filho seu. Vira-o nascer,crescer e tornar-se num bonito prédio. Amparara-o. Estará ciente de que dele se desprende alguma coisa de si. E dali não sai. Encosta-se aos carros estacionados e assiste ao movimento da loja do rez-do-chão. Fora uma ama inexcedível. O boné continua descaído,olhando para todos os lados,zelando.

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